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Foto do escritorManoel Cipriano

QUILOMBOLAS: A LUTA PELA LIBERDADE A PARTIR DO DIREITO AO TERRITÓRIO


Manoel Cipriano[1]

12/05/2023

SUMÁRIO: 1. Delimitação do tema. 2. Conceituando o ser quilombola e onde se encontra. 3. Quilombolas: proteção jurídica do direito ao território. 4 . Considerações. 5. Referências.


1. DELIMITAÇÃO DO TEMA.


A palavra “quilombola” se refere às pessoas afro-decentes remanescentes das comunidades negras, organizadas em quilombos, no curso da escravidão dos povos no território latino-americano. A presente reflexão busca compreender a situação dos povos quilombolas no território brasileiro. Parte da conceituação; a forma como se referenciam e como seguem buscando o reconhecimento de um território como indispensável para a continuidade dos desafios do viver numa sociedade cada vez mais excludente, de modo particular no que se refere ao ser diferente e às riquezas das tradições afro-brasileiras.

2. CONCEITUANDO O SER QUILOMBOLA E ONDE SE ENCONTRA


Em regra, a expressão “quilombola” denomina o conjunto dos povos de origem africana remanescente das comunidades que passaram a viver em territórios próprios fugindo da escravidão. Contudo, a palavra “quilombo” tem origem africana ocidental no termo “kilombo” e significa o “acampamento” ou “o lugar de repouso”, referindo-se aos povos nômades em suas caminhadas cotidianas.

Estima-se que povos quilombolas se encontram presentes em quase todo o território nacional e se identificam por uma riqueza cultural baseada na ancestralidade, contando, em alguns casos, com a convivência junto à presença de indígenas e não indígenas em suas comunidades.

[...]"Os estados brasileiros com o maior número de comunidades remanescentes de quilombos são Bahia, que possui 229 quilombos cadastrados; Maranhão, com 112; Minas Gerais, com 89; e Pará, com 81 comunidades quilombolas cadastradas".[2]

Em relação às condições territoriais, há os quilombolas que vivem afastados do convívio urbano e aqueles que se encontram vivendo nas cidades. Dessa forma, o ser quilombola decorre da auto declaração da pessoa, de modo que expressa uma condição existencial e não um conceito objetivo. Quantitativamente, estima-se grande número de comunidades espalhadas pelo território nacional, sem que tenha tido o reconhecimento das terra em que se encontram.

Mais de quinze mil comunidades quilombolas espalhadas pelo território brasileiro mantêm-se vivas e atuantes, lutando pelo direito de propriedade de suas terras consagrado pela Constituição Federal desde 1988. Tais comunidades estão dispersadas por boa parte do território brasileiro, sobretudo nas regiões Sul, Sudeste, Nordeste e Centro-Oeste.[3]

No Maranhão encontra-se uma das maiores comunidades quilombolas latino- americana, integrando a capital do Estado.

Em 2019, a Fundação Palmares, reconheceu o bairro Liberdade, em São Luís, como comunidade remanescente de quilombo. [9]

O Território Liberdade Quilombola foi o primeiro quilombo urbano reconhecido no Maranhão e sua área abrange cinco bairros de São Luís (Liberdade, Camboa, Fé em Deus, Diamante e Sítio do Meio), com uma população de cerca de 160 mil moradores, constituindo-se num dos maiores quilombos urbanos da América Latina.[4]

A resistência na busca do reconhecimento do ser e de um território quilombola passa a ser uma realidade com garantia no ordenamento jurídico, como se verá adiante.


3. QUILOMBOLAS: PROTEÇÃO JURÍDICA DO DIREITO AO TERRITÓRIO


A situação dos quilombolas vem recebendo preocupação da proteção internacional, da ordem jurídica constitucional, assim como no âmbito da legislação infraconstitucional.

No âmbito do direito internacional, a proteção aos quilombolas tem se dado a partir das normas presentes na Resolução n. 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), assegurando tratamento igual ao dado aos povos indígenas. Isto porque os quilombolas consistem numa realidade de outras nações.

A existência de comunidades de afros-descendentes que se identificam como grupos étnicos e reivindicam seus direitos é registrada não apenas no Brasil, mas também em outros países da América Latina como a Colômbia, Equador, Suriname, Honduras, Belize e Nicarágua.[5]

No âmbito nacional, a ordem jurídica constitucional assegura aos quilombolas o reconhecimento do direito ao território pelos descendentes dos quilombos, ou seja, os quilombolas.

Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras, é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes títulos respectivos.[6]

O texto constitucional assegura, ainda, a garantia das manifestações culturais afro-brasileiras no âmbito da contribuição dada para o processo civilizatório brasileiro.

O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional[7].

No âmbito da legislação infraconstitucional é assegurada a garantia do direito às terras tradicionalmente ocupadas pelos descendentes dos quilombos, garantindo às comunidades quilombolas a identidade a partir de um território.

O direito à terra dos remanescentes de quilombo pode ser identificado como um direito fundamental cultural (art. 215, CF), que se liga à própria identidade de cada membro da comunidade[4]. Com o reconhecimento constitucional da titularidade do domínio das terras, surgiu a necessidade de atuação do poder público, no sentido de declarar a terra como quilombola e conceder-lhes o título de propriedade. O procedimento para a delimitação, demarcação e titulação das terras é regulamentado pelo Decreto n. 4.887/2003.[8]

Ainda no âmbito da proteção jurídica infraconstitucional, responsabilidade da garantia do direito ao território pelos quilombolas cabe aos estados e aos municípios em comum com o governo federal. Dessa forma, cabe à legislação estadual e municipal, assim como aos respectivos órgãos destes entes federativos assegurar e garantir o direito de comunidades quilombolas aos seus territórios, assim como o acesso aos direitos fundamentais.


4 . CONSIDERAÇÕES


Observa-se que os povos quilombolas são uma realidade decorrente do sistema escravocrata implementado no âmbito da modernidade. Na sociedade brasileira, são os remanescentes dos quilombos, forma encontrada por negros fugidos do julgo dos seus senhores no curso da escravidão aqui instalada. Encontram-se presentes no meio rural, assim como no meio urbano, numa continuidade das vivências e tradições culturais afro-descentes. Ainda que haja a proteção jurídica em âmbito global e nacional, as condições de vida de quilombolas continuam em situação precária, não tendo, sequer, o direito à identidade a partir do direito ao território como condição fundamental para a realização do viver com dignidade.

5. REFERÊNCIAS

BRASIL (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 09 Mai. 2023.

BRASIL (2003). Decreto 4.887, de 20 de novembro de 2003. Regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2003/d4887.htm>. Acesso em 11 Mai. 2023.

COMISSÃO PRÓ-ÍNDIO DE SÃO PAULO. Direitos quilombolas. Disponível em <https://cpisp.org.br/direitosquilombolas/leis/legislacao-internacional/>. Acesso em 09 Mai. 2023.

CONSTANTINO, Giuseppe Luigi Pantoja. Do regime jurídico de proteção das comunidades quilombolas. Disponível em <https://www.conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41075/do-regime-juridico-de-protecao-das-comunidades-quilombolas>. Publicação de 30/09/2014.Acesso em 11 Mai. 2023.

EDUCA+BRASIL. Quilombolas: quem são, origem, tradição e condições. Disponível em <https://www.educamaisbrasil.com.br/educacao/noticias/quilombolas-quem-sao-origem-tradicao-e-condicoes>. Publicação de 29/03/2023. Acesso em 09 Mai. 2023.

PEREIRA, Alexander Lucas. Terras em disputa: a luta quilombola pelo território. Disponível em <https://pp.nexojornal.com.br/opiniao/2022/Terras-em-disputa-a-luta-quilombola-pelo-territ%C3%B3rio>. Publicação de 10/02/2022. Acesso em 09 Mai. 2023.

PORFIRIO, Francisco. Quilombolas. Disponível em <https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/quilombolas.htm>. Publicação de 08/05/2023. Acesso em 09 Mai. 2023.

WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Quilombolas. Disponível em <https://pt.wikipedia.org/wiki/Quilombolas>. Acesso em 09 Mai. 2023.

WIKIPÉDIA-A, a enciclopédia livre. Comunidades quilombolas no Maranhão. Disponível em <https://pt.wikipedia.org/wiki/Comunidades_quilombolas_no_Maranh%C3%A3o>. Acesso em 11 Mai. 2023.

[1] Manoel Cipriano Oliveira é Mestre em Educação, com Bacharelado e Especialização em Direito, Bacharelado e Licenciatura em Filosofia pela Universidade Federal de Uberlândia - UFU. Professor Universitário aposentado, foi Defensor Público em Minas Gerais e Servidor do Tribunal Regional da Primeira Região – TRF1. Autor de obras didáticas, poéticas e romances, dentre as quais Noções básicas de filosofia do direito: Iglu Editora, 2001 e Vida de retirante: do arame farpado à favela, a trajetória de uma família, 2001. Jogador de futebol: você já sonhou ser um: Autografia,201; e Amor e existência, um canto à vida, Mepe, 2021. [2] PORFÍRIO, 2023. [3] WIKIPÉDIA, 2023. [4] WIKPÉDIA-A. [5] COMISSSÃO PRÓ-INCIDO DE SÃO PAULO [6] BRASIL, 1988, art. 68, do ADCT. [7] BRASIL, 1988, art. 215, § 1º [8] BRASIL, 2003.

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