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Foto do escritorManoel Cipriano

RACISMO E INJÚRIA RACIAL: CONCEITOS E DIFERENÇAS

Manoel Cipriano[1]

03/08/2023

SUMÁRIO: 1. Palavras iniciais. 2. Conceituando racismo e injuria racial. 3. Racismo Estrutural. 4. Referências.

1. PALAVRAS INICIAIS


Racismo e injúria racial figuram formas de condutas que produzem resultados semelhantes, embora conceitualmente tenham sido apresentados como ações distintas, inclusive para efeitos de responsabilização das pessoas autoras destas ações na convivência social. No sentido de entender a relação entre estas duas modalidades de comportamentos discriminatórios e seus reflexos, de modo particular em relação a população negra, o presente olhar parte da conceituação do racismo e da injuria racial; aponta para a percepção de desigualdade entre pessoas brancas e negras, a partir de dados que expressam esta realidade; traz um pouco sobre o processo histórico em que foi tecida e consolidada uma sociedade cuja estrutura econômica e política resultou na segregação social da população pobre, com maior intensidade na exclusão de negras e negros no âmbito da sociedade brasileira.


2. CONCEITUANDO RACISMO E INJÚRIA RACIAL


Para além das práticas institucionais, aquelas que ganharam vida objetiva na 0estrutura social, o racismo pode ser entendido como conduta resultante de um processo histórico e político em que se deram as condições de subalternização de sujeitos racializados, se reproduz de forma intrínseca e expressa na estrutura de uma determinada sociedade.[2] Isto induz dizer que numa sociedade em que a regra é a concentração de renda, assim como a apropriação da riqueza por alguns em detrimento e exclusão de sua maior parte, há uma estrutura intrinsecamente discriminatória e, por isso mesmo, racista, além de machista.

Na perspectiva jurídica, o racismo se constitui como uma conduta que ocorre em vista de uma coletividade, ou seja, dirige-se a uma pluralidade de pessoas de forma indeterminada, com fulcro na etnia, na religião, na origem desta coletividade.

A injúria racial, por sua vez, consiste numa conduta praticada com o fito de atingir a dignidade e decoro de uma pessoa utilizando de ofensas a partir do uso de elementos de etnia, de raça, de religião ou de outra condição particular da pessoa.

Dessa e considerando estes aspectos, na injuria racial a pessoa atingida pode ser identificada desde logo. Ao passo que, no racismo, a conduta realizada visa uma indeterminação de pessoas e, ainda que a pessoa autora desta ação se dirija a um indivíduo singular, os feitos são coletivos.

Nota-se, no entanto, que a descaracterização do tipo penal racismo para injúria racial tem sido uma maneira de amenizar os efeitos da conduta praticada. De igual modo, tenta enfraquecer o enfrentamento de ações que permeiam a estrutura social e, estritamente, busca evitar a aplicação de alguns institutos jurídicos integrantes da caracterização do racismo, a exemplo da imprescritibilidade e de não ser um delito inafiançável nos termo das garantias constitucionais, no caso da ordem jurídica brasileira atual.

3. RACISMO ESTRUTURAL


No sentido estrutural, ou seja, de uma conduta entranhada subjetiva e objetivamente numa determinada sociedade, o racismo se manifesta como um processo pelo qual uma determinada conduta se disseminou nas ações particulares e coletivas como algo inerente à estrutura social, econômica e política passando integrar o agir particular e coletivo.

Neste sentido, os dados revelam que pessoas brancas ganham 68% a mais do que pessoas negras; que 65% dos lares administrados por pessoas negras se encontram em situação de insegurança alimentar; que as mulheres negras são 28% da população, contudo ocupam somente 5,6% das cadeiras na Câmara dos Deputados Federais; e que 84% das pessoas mortas em ações policiais são de negras e negros.

Este cenário, por si só, demonstra que a sociedade brasileira atual se expressa como resultado de um processo histórico em que as pessoas pobres, os povos originários e, de modo particular, as pessoas negras foram excluídas do acesso às condições básicas, sendo lhes retirada a dignidade humana, uma das garantias universais.

Dessa maneira, a carência de emprego, a falta de moradia, impossibilidade de acesso à saúde, à educação, ao saneamento básico, à terra para desta tirar os bens da vida, são direitos dos quais estas populações ou coletividades vivenciam diuturnamente. Além do que, esta condição coletiva, está na base de ações de encarceramento, de massacres individuais e coletivos nas periferias e no campo em decorrência de ações de organizações privadas paramilitares, assim como estrutura de segurança do poder público.

Deduz-se, então, que o racismo e a injuria racial, embora conceitualmente diferentes, produzem resultados semelhantes. Desta maneira, esta ações atingem pessoas particulares, assim como refletem nas coletividades; o que independe da conceituação ou da tipificação legal que lhes seja atribuída. Por isso, bem acertado o entendimento que passou a reconhecer não haver distinção entre racismo e injúria racial, uma vez que uma e outra ação atingem a coletividade e, por consequência, ferem as pessoas em sua singularidade e integrante da sociedade as quais suportam os reflexos diretos e indiretos em decorrência da prática destas formas de condutas discriminatórias.

4. REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 03 Ago. 2023.

BRASIL. Lei 7,716, de 05 de janeiro de 1989. Define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7716.htm>. Acesso em 03 Ago. 2023.

BRASIL. Lei nº 14.532 de 11/01/2023. Altera a Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989 (Lei do Crime Racial), e o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), para tipificar como crime de racismo a injúria racial, prever pena de suspensão de direito em caso de racismo praticado no contexto de atividade esportiva ou artística e prever pena para o racismo religioso e recreativo e para o praticado por funcionário público. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2023/lei/l14532.htm>. Acesso em 03 Ago. 2023.


[1] Manoel Cipriano Oliveira é Mestre em Educação, com Bacharelado e Especialização em Direito, Bacharelado e Licenciatura em Filosofia pela Universidade Federal de Uberlândia - UFU. Professor Universitário aposentado, foi Defensor Público em Minas Gerais e Servidor do Tribunal Regional da Primeira Região – TRF1. Autor de obras didáticas, poéticas e romances, dentre as quais Noções básicas de filosofia do direito: Iglu Editora, 2001 e Vida de retirante: do arame farpado à favela, a trajetória de uma família, 2001. Jogador de futebol: você já sonhou ser um: Autografia,201; e Amor e existência, um canto à vida, Mepe, 2021. [2] OXFAN.

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